quinta-feira, 17 de outubro de 2013



Por uma Universidade de Polícia humanista e humanizadora.



O conceito Corporate University será em breve aplicado pela Polícia Militar do Estado de São Paulo – PMESP acompanhando a tendência corporativa internacional de adotar paulatina e sistematicamente boas práticas acadêmicas revolucionando seus setores de treinamento de pessoal. Trata-se, sobretudo, do ensino continuado e do ensino à distância com foco não apenas na formação de seu efetivo (habilidades profissionais) para uma específica matriz de competências, mas também para a pesquisa de novas soluções para os problemas de Segurança Pública (novos conhecimentos profissionais).

Aqui há uma novidade: por novos conhecimentos profissionais entende-se crescentemente conteúdos das ciências humanas – ou humanidades –  que sempre foram vistas como acessórias no ensino militar e que agora passam a ser vistas como insubstituíveis em um determinado efeito que só estas produzem. Em efeito, poucos sabem, mas descobre-se lentamente que na história da educação no Ocidente, sob o nome de retórica, as humanidades sempre foram estudadas pelas elites econômicas, não por luxo, mas porque, possuem uma eficaz funcionalidade na conquista de corações e mentes.

 Sim, especialmente nas democracias em que a lei proíbe a violência, abusos e assédios, estas elites se esmeram em preparar seus filhos com professores particulares para defenderem os interesses de família substituindo as armas por palavras e discursos feitos para conquistar a adesão voluntária de quem ouve.

E todos ganham se também na polícia fardada e ostensiva acontece a gradual substituição da ameaça com armas e talonários de multa pela persuasão com palavras: o cidadão é menos coagido e melhor abordado e o policial-militar é mais valorizado pela sociedade e pela própria administração policial que se aperfeiçoar na arte de motivar e inspirar persuasivamente seus profissionais para o trabalho sem recurso às sanções e punições internas.

Do contrário, se por novos conhecimentos profissionais entende-se apenas conhecimentos técnicos e habilidades práticas que se ensina e se cobra unicamente com o método de premiação e punição – é preciso dizer – a Universidade de Polícia será um aparelho administrativo mais eficaz, mais econômico e mais rápido na meta de capacitar seus profissionais para a oferta de serviços-padrão de segurança pública, no entanto, estes resultados não terão lastro, serão inconstantes, sofrerão crises porque não estarão fundados em bases duradouras.

Sobretudo porque, se a gestão de ensino policial-militar tratar exclusivamente de conhecimentos técnicos e habilidades profissionais, ela confiará – sem confessar ou saber – unicamente nas leis de mercado dizendo para si mesma: ensino bem e mais, gastando menos tempo e dinheiro e se o profissional não aplicar o que aprendeu, eu simplesmente o troco por outro no mercado de trabalho. Esta não é uma relação de confiança, é uma relação de poder.

Devemos evitar este admirável mundo novo em que o progresso técnico, ao invés de servir ao homem, o oprime, o instrumentaliza, o desumaniza e o torna descartável, colocando-o em posição adversa à administração, em atitude defensiva e rancorosa na sua impotência ocasional em abrir mão de seu emprego público. Este é o real motivo da irrupção de crises institucionais cuja culpa é sempre direcionada com habilidade para o administrado, pelo descumprimento de um procedimento padrão, e não para a administração que deveria ser capaz de persuadi-lo a seguir este procedimento em uma relação de confiança.


Naturalmente, auspiciamos em São Paulo uma Universidade de Polícia que será eficaz, econômica e ágil e que também possuirá uma feição humanística e humanizadora, pois, afinal, como ensinava Erasmo de Rotterdam, o príncipe dos humanistas, o homem não nasce homem, ele torna-se homem. 

-------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------
Lúcio Nassaro é Tenente-Coronel da Policia Militar do Estado de São Paulo graduado em Filosofia, Mestre e doutorado em Ética e Filosofia Política pela USP depois estudar, como bolsista da CAPES na França 2008-2009.  Em 2012 defendeu sua segunda tese de doutorado, desta vez em Ciências Policiais de Segurança e Ordem Pública no Centro de Altos Estudos da PMESP. Atualmente é comandante do 50º BPM/M. Email: lucionassaro@yahoo.com.