quinta-feira, 20 de setembro de 2012

Os humanistas na PMESP devem falar a linguagem dos modernos Gestores Estratégicos






Os humanistas na PMESP devem falar a linguagem dos modernos Gestores Estratégicos [1]


O conceito Corporate University será em breve aplicado pela Polícia Militar do Estado de São Paulo – PMESP acompanhando a tendência corporativa internacional de adotar boas práticas acadêmicas revolucionando seus setores de treinamento de pessoal. através do ensino continuado e ensino à distância focando não apenas a formação de seu efetivo (habilidades profissionais) para uma específica matriz de competências, mas também a pesquisa de novas soluções para os problemas de Segurança Pública (novos conhecimentos profissionais) que signifiquem um diferencial competitivo para a Instituição e a tornem referência na oferta de serviços de Segurança Pública. São estes os parâmetros e linguagem que os Gestores Estratégicos esperam de quem defenda uma Universidade de Polícia com feições humanísticas.




No artigo anterior “Por uma Universidade de Polícia com feições humanísticas”, postado neste Blog em 16Set12, fizemos a defesa das humanidades como área de conhecimento com a qual a futura universidade corporativa da PMESP deve estar visceralmente vinculada desde seu nascedouro. E esta defesa, depois de mostrar rapidamente algumas vantagens pontuais desta disciplina, desdobrou argumentos que fazem apelo ao valor das disciplinas humanas na formação do policial militar como ser humano. E aquele artigo insistiu que o conhecimento das humanidades (língua portuguesa, história e literatura voltadas para a percepção crítica em si e nos outros dos dramas sociais/políticos e individuais/éticos) não deve ser apenas exigido na prova de ingresso na Instituição, mas seu ensino deve ser aprofundado continuamente nas fileiras da Instituição, fundamentalmente porque o homem não nasce homem ele se torna.

Tudo muito humano, mas que pode soar como uma cantilena para ouvintes apressados em obter definição sintética de métodos, indicadores, números e resultados para a Segurança Pública. Sobretudo porque – dizem acertadamente – não há nada mais humanitário que proteger com eficácia a vida e a integridade física de 43 milhões de habitantes do Estado de São Paulo!

E têm razão os Gestores Estratégicos da PMESP. O que há em comum entre o trabalho da polícia preventiva e ostensiva composta pelos militares estaduais, absorvidos inteiramente pelas emergências do telefone 190, preocupados com a segurança, rapidez e legalidade de cada providência, empenhados em obter o melhor da tecnologia para seu trabalho arriscado, e as acadêmicas ciências humanas e suas empoeiradas frases greco-latinas?

 No entanto, os fatos se precipitam na área de ensino: Lei Complementar Estadual nº 1036 de 11Jan08, Lei de Ensino da Instituição, sua regulamentação pelo Decreto Estadual nº 54.911 de 14Out09 e edição da D-5-PM – Diretriz Geral de Ensino em 22Abr10, que determina a redação dos Regimentos Internos dos recém-promovidos órgãos de ensino superior da PMESP, criação em 22Ago12 pelo Bol G PM 159  do Grupo de Trabalho para o desenho de uma Fundação de Apoio ao Ensino e Cultura etc.

No alto da pirâmide do Ensino PM está o Centro de Altos Estudos de Segurança – CAES "Cel PM Nelson Freire Terra" que passa a oferecer o curso de Mestrado e Doutorado em Ciências Policias de Segurança reconhecidos pelo Estado de São Paulo, e já se organiza para obter a médio prazo a recomendação do seu programa de pós-graduação strictu sensu pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – CAPES, o órgão federal responsável pela avaliação da pós-graduação no Brasil.

Estes avanços na legislação de ensino somados às múltiplas iniciativas individuais de Oficiais com experiência acadêmica e à adoção da doutrina da Gestão pela Qualidade desde 1997 são responsáveis pela crescente incorporação na área de ensino da PMESP de boas práticas do meio universitário. Agora a nova doutrina da Gestão Estratégica, em busca de maior eficácia para a área de ensino e com foco em resultados quantificáveis, quer acelerar a adoção destas práticas acadêmicas e cogita a iminente fundação da Universidade de Polícia.

Então, em 2012, temos diante de nossos olhos, um quadro em que a gestão estratégica compreende as vantagens operacionais de eficiência e eficácia da criação de uma Universidade de Polícia e torna-se urgente a necessidade de explicar para os Gestores Estratégicos: Por que esta nascente universidade deveria ter feições humanísticas? Por que é tão importante que a marca, a ideia, o conceito de uma Universidade de Polícia deva nascer já com um aspecto humanístico?  Por que deve esta ser o baluarte da eficiência, mas também da difusão de uma cultura de Direitos Humanos? E por que esta universidade deveria ser o carro chefe de um movimento de humanização do serviço policial-militar? O que é humanização, afinal? Não é o mesmo que valorização profissional?

É preciso que os humanistas da PMESP expliquem todas estas questões para gestores estratégicos que entendem da área da administração moderna, são pessoas profundamente éticas, querem os resultados bons para todos, mas não são da área das humanidades e talvez vejam nestas disciplinas uma perfumaria, algo que não afeta o real. Assim, é urgente criar uma ponte entre estas duas áreas de conhecimento. Isto quer dizer, resumidamente, que estamos diante de um impasse comunicativo.

Acontece que é preciso lembrar e assumir que a responsabilidade pela comunicação é do comunicador que toma a iniciativa de comunicar e que não é razoável culpar o ouvinte pela não compreensão da mensagem se o interesse em ser compreendido é de quem comunica. Assim se os humanistas têm o interesse em colaborar com suas ideias sendo bem compreendidos, então são os humanistas que devem ser capazes de se fazerem entender.

Bem, abrindo sua caixa de ferramentas, os humanistas precisam propor antes de tudo que esta nova Instituição de Ensino – a Universidade de Polícia – que venha a catapultar para novíssima fase todas as escolas policiais-militares, deve possuir, já na sua criação, um perfil humanístico, porque este perfil definirá a longo prazo, a face de toda a Instituição polícial-militar.

Do contrário, é preciso dizer, a Universidade de Polícia será apenas um aparelho administrativo mais eficaz, mais econômico e mais rápido na meta de capacitar seus profissionais para a oferta de serviços-padrão de segurança pública, preconizados pela Gestão Estratégica movida por resultados a curto prazo, e que, no entanto, não terão lastro, serão inconstantes, sofrerão crises porque não estarão fundados em bases duradouras. Sobretudo porque esta gestão por resultados mensuráveis confia – sem confessar ou saber – unicamente nas leis de mercado dizendo para si mesma: ensino bem e mais, gastando menos tempo e dinheiro e se o profissional não aplicar o que aprendeu, eu simplesmente o troco por outro no mercado de trabalho. Esta não é uma relação de confiança, é uma relação de poder.

Devemos evitar este admirável mundo novo em que o progresso técnico, ao invés de servir ao homem, o oprime, o instrumentaliza e o torna descartável, colocando-o em posição adversa à administração, em atitude defensiva e rancorosa na sua impotência ocasional em abrir mão de seu emprego público que é o real motivo da irrupção de crises institucionais cuja culpa é sempre direcionada com habilidade para o administrado pelo não cumprimento de um procedimento padrão e não para administração que deveria ser capaz de persuadí-lo a seguir este padrão em uma relação de confiança.

Naturalmente, auspiciamos uma Universidade de Polícia que seja eficaz, econômica e ágil, mas que também seja capaz de superar e substituir em um órgão policial a subcultura de violência e a cultura de competição e relações baseadas no poder – ainda comuns, apesar dos progressos, em toda a sociedade brasileira – por relações baseadas na convicção na igualdade de todos diante das leis, na vantagem, para cada um de nós, da solidariedade e da prioridade para o bem comum.

Para tão importantes objetivos práticos cabe à vanguarda humanista, entre as fileiras dos militares estaduais de São Paulo, abrir mão de seus discursos puramente éticos que, de argumento em argumento, se elevam aos altíssimos e sublimes – mas incompreensíveis – pícaros nevados do valor ético que deve ser buscado, enfim, por ser valor ético.

Este argumento platônico, sempre focado em um ideal de humanidade realizável em cada um de nós, e apresentado como a melhor retribuição pessoal e assim a melhor garantia para o comportamento ético individual,  é demais abstrato, ofuscante e frustrante em tempos de gestão por resultados e seu credo: só administra quem dispõe de indicadores mensuráveis.

Cabe a esta vanguarda então não ser inocente, respeitar os tempos que urgem por conhecer e controlar os meios que produzem resultados visíveis, e encontrar os pensamentos e palavras satisfatórias para explicar, claramente e em detalhes, para os homens e mulheres policiais-militares, extremamente pragmáticos e acostumados a atenderem pessoas em perigo, o que significa agregar um caráter humanístico à eficácia, economia e rapidez do ensino profissional e, enfim, o que é mais difícil, explicar tecnicamente para administradores como (isto é, com que meios) as humanidades podem agregar à eficácia, economia e rapidez do ensino moderno um lastro, uma constância, uma garantia duradoura contra crises para seu padrão de serviços de referência (isto é, atingir a meta da Instituição).

Desde que a maioria dos discursos humanísticos caem neste fácil circulo vicioso, nesta tautologia, de mostrar o valor dos valores humanísticos, o desafio que se apresenta para aqueles que defendem a fundação de uma Universidade de Polícia com feições humanísticas é, portanto, de indicar para a administração contemporânea a funcionalidade das humanidades, ou seja, a sua utilidade. Ou ainda, para que serve.

Isto retomaremos em um próximo artigo.




Obrigado pela leitura. Se reproduzir total ou parcialmente este texto, peço apenas que cite a fonte.





[1]  O autor é Tenente-Coronel da Policia Militar do Estado de São Paulo, bacharel em Ciências Policiais de Segurança e Ordem Pública pela Academia de Polícia Militar do Barro Branco (APMBB), Mestre em Ciências Policiais de Segurança e Ordem Pública pelo Centro de Altos Estudos de Segurança “Cel PM Nelson Freire Terra” (CAES), graduado em Filosofia, Mestre e Doutor em Ética e Filosofia Política pela USP (2010) depois de ter estudado como bolsista da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) na França 2008/2009.. Atualmente é doutorando em Ciências Policiais de Segurança e Ordem Pública pelo CAES e comandante do 17ª BPM/M. Email: lucion@policiamilitar.sp.gov.br. 

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